Por muito tempo, eu acreditei que era uma pessoa indisciplinada, desorganizada e que não se adaptava a rotinas. Dizia que era uma Virginiana fajuta, que tinha nascido na data errada. Se for analisar bem fundo, eu ainda acredito nisso. Mas estou me esforçando diariamente para mudar essa crença e esses comportamentos. Um dos piores comportamentos de quem se acredita avesso à disciplina é a procrastinação. Se você é indisciplinado, você não tem hora certa para fazer as coisas. Então, você vive apagando incêndios, fazendo tudo de última hora, quando dá tempo, o que geralmente quer dizer quando já não há tempo para fazer.
Para mim, a origem disso tudo está numa necessidade de rebeldia. Durante a adolescência, fui criando o discurso de “ninguém manda em mim e eu vou fazer o que eu quiser”. Coisas naturais da idade. Nessa época da vida, temos a grande visão de estar lutando contra um sistema ditatorial em todas as instâncias, desde a família até a escola e a sociedade em geral. Nos rebelamos contra tudo e contra todos. Estava descobrindo a minha voz no mundo e precisava, de fato, me separar dos outros e de suas opiniões, para realmente me ouvir. Lembro como era difícil saber o que eu queria quando muita gente me dizia o que fazer. Então eu precisava separar esses discursos e literalmente não ouvir as sugestões e imposições alheias para poder ouvir as minhas próprias ideias e entender o meu jeito de viver a vida e de ser no mundo.
Esse pensamento me serviu bem por uns anos, mas hoje a situação é completamente diferente. No entanto, o sentimento de rebeldia persiste em muitas coisas. É engraçado como nos agarramos a crenças antigas que não nos servem mais e nos vemos agindo como se estivéssemos vivendo há anos atrás.
Isso influencia diretamente na minha busca por uma vida saudável, com alimentação mais consciente e exercícios físicos, e também no estabelecimento de uma rotina sustentável, em que eu seja capaz de realizar todas as coisas importantes que quero realizar. Fica impossível fazer tudo isso, se você não for disciplinado. Me vi incontáveis vezes saindo da nutricionista e comprando uma barra de chocolate na farmácia logo abaixo do consultório. Comprava e comia pensando: “Ninguém vai mandar em mim, porque eu vou fazer o que quiser”. Ou, às vezes, comia a barra de chocolate antes de ir na consulta. O mais engraçado é que ela nunca tentou me obrigar a deixar de comer ou a passar a comer nada. Mas eu não estava falando isso para ela. Eu estava falando isso para mim mesma. Sempre que precisava realizar uma tarefa obrigatória (fazer trabalhos acadêmicos e profissionais, arrumar a casa, cozinhar), eu me via dizendo a mesma coisa e procrastava até não poder mais. Na verdade, eu só ficava ecoando a voz daquela adolescente rebelde, dizendo isso para os mesmos “algozes” do passado, que, na minha cabeça, me vigiavam e queriam mandar nas minhas ações. Quantas coisas eu fiz em nome dessa rebeldia, só para provar que podia fazer e “esfregar na cara da sociedade”, mesmo que ninguém visse! Que satisfação interna! Quantos danos autoinfligidos! Que coisa louca e fantástica que é a nossa mente!
O mais importante de tudo isso é reconhecer onde estamos e como fazer para mudar. Ficar ligado somente ao passado e aos porquês é cansativo e um gatilho depressivo. Você dá voltas e voltas em análises sustentadas por mil teorias e não sai do lugar. Só saímos do lugar com novos significados que trazem aprendizados para as situações que causaram sofrimento e que nos impulsionam para frente, para realizações que trazem crescimento. Vencer a minha rebeldia interna, dar um novo significado para as minhas ações diárias ligadas à disciplina, significa entender por que estou fazendo o que faço. Procuro manter a alimentação saudável, a atividade física, os trabalhos acadêmicos e profissionais em dia para agradar a alguém? Para agradar à sociedade? Para ter um corpo bonito que se encaixa num padrão e ser uma “boa pessoa” para o mundo? Nada disso tem um realmente sentido para mim. Enquanto eu continuasse pensando que estava fazendo as coisas por esses motivos, eu estava fazendo as coisas pelos outros. E a resposta para o que os outros querem, nós já conhecemos: “Ninguém manda em mim…” Ou seja, esses motivos ativavam o gatilho da rebeldia.
A questão é por que eu quero fazer essas coisas? Isso precisa estar ligado ao meu propósito de vida. Eu quero ter uma vida saudável e longa. Digo sempre que quero viver mais duas vidas pelo menos, o que me coloca na casa dos 90 a 100 anos de idade. Sinto que comecei a viver de verdade há tão pouco tempo e tenho tanto a realizar! E quero ver onde essa modernidade vai nos levar no futuro. Sério, quero estar aqui para ver as pessoas indo morar em Marte, as inteligências artificiais tomando a frente de cada vez mais tarefas, as descobertas fantásticas da astronomia e da física quântica, a erradicação de doenças, quero estar aqui para ver esse futuro! Você pode achar que a conversa agora ficou muito louca, mas, alguém duvida que, em 60 anos, estaremos vivendo todas essas coisas? Além disso, quero aprender incansavelmente, fazer incontáveis cursos, viajar pelo mundo, mudar minha visão de vida a cada experiência impactante, participar do desenvolvimento de outras pessoas, promover o crescimento alheio e escrever, escrever muito e fazer um nome com isso. São tantos sonhos, que se tornam muito grandes para uma vida curta, entende?
Eu digo que quero viver mais 60 anos num pensamento pessimista, porque eu sei que a vida que levo hoje não me permitem viajar muito em relação a isso. Com a vida que levo hoje, eu vou ter sorte de passar dos 60 anos. Por isso, preciso mudar e já! Se eu já tivesse adotado uma vida saudável desde sempre, eu podia colocar como meta passar dos 100 anos e estaria tudo bem. Porque é claro que eu quero alcançar a longevidade com qualidade de vida. Ser aquelas velhinhas sábias, com boa memória, boa saúde e boa locomoção. Engraçado é que eu me imagino como uma velhinha indígena, de cabelos brancos trançados e pele morena muito enrugada. Eu nunca serei essa velhinha indígena de pele morena por questões genéticas. Mas tudo bem! Eu aceito virar uma velhinha branquela.
Quando eu penso nesse projeto de vida louco, tudo muda de figura. Manter uma alimentação saudável, fazer exercícios físicos, escrever diariamente, me dedicar aos estudos e ao trabalho, manter a casa limpa e arrumada, manter um bom relacionamento conjugal, com a família e com amigos – tudo se encaixa em um plano de vida maior. Nada mais é porque alguém quer por motivos que não consigo entender. Tudo está ligado ao que eu quero da minha vida. A disciplina, então, passa a ser um meio para alcançar tudo isso.
Gostaria de dizer que estou muito avançada em matéria de ter essa disciplina e que faço tudo o que planejo diariamente, mas ainda não é verdade. Ênfase no “ainda”. O importante é que estamos dando os primeiros passos. E são os primeiros passos que constroem a grande caminhada.